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quarta-feira, 22 de setembro de 2010

FIM DE TARDE


IL GUARANY (Finale) Placido Domingo & Veronica Villarroel


ntônio Carlos Gomes (Brazil 1836-1896)

IL GUARANY : Opera in four acts. After the novel "O GUARANI" by José de Alencar (Brazil,1829-1877)

Cecilia : Veronica Villarroel
Pery : Placido Domingo
Don Antonio de Mariz (Cecilia's father): Hao Jiang Tian

Act Four / Quatrième acte

Gran scena e terzetto finale ultimo : "Padre!" - "Con te giurai di vivere"

Chorus and extras: Adventurers of various nations. Men and women of the Portuguese colony. Indians of the Aimorè tribe. The action takes place in Brazil, not far from Rio de Janeiro, in the year 1560.
Chor und Extrachor der Oper der Stadt Bonn
Markus Oppeneiger, Chorus Master

Orchestra der Beethovenhalle Bonn
John Neschling
1994.
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"O ESCRAVO"


CARTA DE CARLOS GOMES A D. PEDRO II SOBRE "LO SCHIAVO"

“Senhor,
Por intermédio do Exmo Ministro Lopes Netto recebi mais uma saudação da parte de Vossa Majestade, que foi para mim da mais subida honra e prazer.
É, pois, com toda sinceridade que também eu, como verdadeiro amigo, saúdo Vossa Majestade e toda a Augusta Família Imperial.
Há mais de dois anos que vivo procrastinando o dia de escrever a V.M. com o fim de fazê-lo ciente da luta que ando sustentando em silêncio. Demorei até hoje na esperança que um golpe de fortuna me viesse livrar da triste situação em que me acho.
Pelo contrário tenho andado de mal a pior.
A única boa notícia que hoje posso dar a V.M. é que finalmente a minha nova ópera O Escravo está concluída na parte musical, faltando somente passar toda a ópera em Partitura de Orquestra, cujo trabalho material requer ainda 5 ou 6 meses.
Com mais esta ópera cumpro um voto do meu coração de brasileiro patriota. É um Guarani correto.
Era meu desejo fazer a estreia desta ópera no Brasil ou na Europa sem depender dos editores, mas não tenho meios para conseguir essa desejada vitória: falo de meios pecuniários.
Sei que V.M. se interessa por mim e há de estimar que eu seja franco: assim não é somente ao Imperador do Brasil que eu tenho a honra de escrever; é também a um amigo e protetor. Animado por esse sentimento, escrevo, enfim, com a franqueza do meu costume e do meu dever.
“Ora incomincian le dolenti note.”
É notório que em 1870, cedi, quase grátis, a propriedade absoluta das minhas óperas Guarany e Fosca ao editor Lucca de Milão, – onde estava o meu juízo (se algum dia o tive) quando assinei semelhantes contratos!
O mal, porém, está feito e não há remédio.
Em 1874, desgostoso com o editor Lucca, escrevi para a Casa Ricordi o Salvador Rosa, que conta já 11 anos de sucesso. O contrato que essa Casa me ofereceu então pela dita ópera era sofrível, mas de outro lado as consequências foram para mim fatais. Com a mudança de editor a Casa Lucca tem se vingado de mim cruelmente, negando a Ópera Fosca aos teatros da Europa, e sobre tudo ao repertório italiano; de modo que os meus direitos de autor sobre essa ópera foram nulos durante o tempo que me competiam e hoje estão terminados.
Qualquer lucro que de ora em diante houver será para o editor, ficando a mim somente o eco das harmonias!
O Guarani, que também conta já 15 anos de sucesso, foi sempre propriedade absoluta do editor desde 1870 em que se deu pela primeira vez, e por isso dele nunca recebi direitos de autor na Europa. O Salvador Rosa na Itália e mesmo fora já está muito conhecido e principia a render bem pouco ao editor e por conseguinte muito menos ao pobre autor.
A Maria Tudor é ainda hoje um problema, e não compreendo a razão pela qual o editor Ricordi tem se mostrado sempre intransigente com as empresas que se tem oferecido para pô-la em cena.
O autor, neste caso, é sempre a última roda do carro por ser a ópera de propriedade do editor.
Eu sou tão caipora que até mesmo no Brasil esta Ópera tem ficado no esquecimento.
Estas e muitas outras graves contrariedades têm sido a causa dos meus contínuos atrasos.
Tenho lutado muito, muitíssimo, mas hoje vivo desanimado. É necessário por isso que eu confesse tudo a V. Majestade.
Logo depois da Tudor o meu desejo foi escrever outra ópera de assunto puramente nacional, lisonjeado, como fui, por alguns amigos daí que era provável que me fosse dada oficialmente a comissão de escrever uma ópera de assunto nacional e expressamente para o Brasil. Mas faltava-me o libreto (o libreto!). Gravíssimos desgostos de família deram motivo à minha viagem ao Brasil em 1880, procurando sanar certas dolorosas feridas que só se curam no cemitério. Em 1882 e 83 fui também ao Norte do Império arrastado por um empresário que me prometeu o que não cumpriu, e de lá voltei arrependido por ter perdido o meu tempo sem nada ter avantajado em interesses.
Não me faltaram também os falsos amigos nessa ocasião. Mesmo, porém, em viagem a minha ideia fixa foi sempre o Escravo, do qual os jornais mexeriqueiros do Brasil já tinham dado notícia com antecedência.
No principio da formação desse libreto as dificuldades foram tais que desanimei e abandonei-o por alguns meses. Lancei mão logo em outros libretos: o primeiro Leona (assunto espanhol), o segundo Oldrada (assunto alemão). Cheguei até a metade dessas duas óperas e reconheci que era, como é, melhor a primeira ideia.
Voltei enfim decididamente ao assunto nacional; mas o poeta já tinha perdido a paciência comigo, e eu com ele… Mas era necessário libertar o Escravo!
Principiei “da capo” sustentando um duplo trabalho. Inventei o drama, compus a poesia e a música ao mesmo tempo. Um “tour” de foice! Conheço que não sou Wagner nem Brito quanto aos conhecimentos literários, mas também não passei todo o meu tempo no estudo da música; tenho lido muitos autores antigos e modernos; conheço as regras da poesia e com bastante prática da cena e com a minha força de vontade compus todo o libreto do Escravo.
Quanto à música d’esta ópera “ai posteri l’ardua sentenza!”
Consta-me que V.M. leu o libreto, podendo assim julgar se um italiano que não conhece o Brasil e que nada tem lido a respeito poderia imaginar certas cenas puramente brasileiras e que só um filho do sertão como eu poderia reproduzir.
Como, porém, poderei continuar com ânimo tranquilo no trabalho, ainda que material, da Partitura, faltando-me hoje todos os recursos para mim e meus filhos, e ainda cercado de credores?
Hoje é só a humilhação, daqui a cerca de 3 meses será um naufrágio à vista do porto!
Imagine V. Majestade que a minha casa, edificada no campo com o fruto de antigas economias, está hipotecada por pouco menos do valor e que devo ainda mais 46 mil francos ao Banco de Lecco, dinheiro tomado pouco a pouco para viver durante estes 3 últimos anos em que nada tenho recebido das minhas óperas tanto na Itália como no Brasil.
Minhas óperas estão depositadas em São Paulo, Rio de Janeiro, Bahia, Pernambuco e Pará. Se houvesse um pouco de boa vontade da parte dos meus amigos do Brasil, os empresários não passariam sem representá-las anualmente e com esse produto eu teria podido viver sem humilhações, sem individar-me e sem viver pedindo…
É triste para quem, como eu, vive necessitado saber que pessoas estranhas se aproveitam dos meus trabalhos rindo-se de mim. E isso tem me acontecido várias vezes no Brasil.
No Rio Grande do Sul se tem representado o Guarany sem que eu possa reclamar os meus direitos contra a violência dos empresários italianos que por lá andam, não tendo eu amigos naquela Província e não sabendo a qual autoridade dirigir-me. Até a Senhora Coaracy serviu-se da música da minha ópera para o drama Guarany dado ultimamente na Corte. Outros, sem minha permissão, cantam em seus benefícios pedaços das minhas óperas e sem curar-se dos meus direitos de autor. São miudezas, mas na minha posição até o pouco me serviria.
E como tenho passado até hoje?
Já o disse a V. Majestade: do crédito e da estima que, modéstia de parte, gozo da Itália, mas o crédito tem seu limite e o Banco de Lecco já me deu a entender que está cansado de renovar as letras e quer o importe.
Essas letras vencem-se a 9 de dezembro próximo. O que hei de fazer?
Bati já a todas as portas de onde podia esperar algum socorro: o Compadre Castellões respondeu-me que para o futuro espera obter uma récita em meu benefício.
Mas isso é para o futuro!
Meu irmão respondeu-me que não me pode socorrer. O Ricordi está muito alcançado nos seus negócios e impossibilitado de adiantar-me quantia alguma.
É uma coincidência singular: em 1870 V. Majestade Imperial abriu as portas do Scala para o Guarany. Hoje o Escravo, que é o meu segundo Guarany não poderá viver nem ser libertado se V. M. não lhe estende a mão benéfica.
Até que pude calei-me para não afligir a V. Majestade; hoje, porém, sou obrigado a confessar toda a verdade, e conhecendo o coração magnânimo de V. Majestade e conhecendo quanto me é amigo ouso pedir e suplicar que me empreste a quantia de 50 mil francos que me são indispensáveis para me salvar da triste posição em que me acho.
Com mais esta imensa graça V. Majestade salva um pai de família, um amigo, um artista e mais um Escravo!
Beijando a augusta mão de V. Majestade peço desculpa da prolixidade desta carta e me assino com toda a sinceridade do meu coração.
De V. Majestade Imperial
Amigo muito grato e súbdito fiel
A. Carlos Gomes

Milano 19 de setembro de 1885”

"O ESCRAVO"


A ópera mais bonita de todas as compostas por CARLOS GOMES baseia-se, inicialmente, em uma peça de teatro de Alexandre Dumas Filho, pouquíssimo conhecida e comentada, chamada Les Danicheff em fatos reais da vida de Alfredo Taunay, amigo de CARLOS GOMES e no poema épico A Confederação dos Tamoios, de Domingos José Gonçalves de Magalhães, inspirado em fatos verídicos da História do Brasil.

No aspecto cênico e teatral, tudo é lógico e de fácil entendimento e a música a tudo valoriza com admirável efetividade, tornando mais uniforme a obra. Não há desequilíbrios, nem cênicos e nem musicais, é uma ópera nobre na sua uniformidade, simplicidade e no seu equilíbrio.


A abertura – A ALVORADA – é perfeita – trecho musical de raros dotes descritivos, cheio de matizes orquestrais evocando, em sonoridades vivas, a madrugada na floresta tropical, entre o murmúrio do arvoredo e o canto delicioso de nossos pássaros, terminando com um dinamismo orquestral riquíssimo e verdadeiramente empolgante. São oito páginas saborosas, formando um poema musical de infinita delicadeza.


O tom é novo e o sentimento nacional em que a ópera é inspirada contribui para tal renovação, bem como a maturidade do artista que ao enfrentar pela segunda vez um enredo pátrio, torna-se consciente dos próprios meios.
Em uma carta de Gino Marinuzzi endereçada a Itala Gomes em 11 de fevereiro de 1937, o regente e compositor italiano diz: “Lo Schiavo, opera veramente nobile.”


CARLOS GOMES vende Lo Schiavo à Casa Ricordi, que fica com 40% dos lucros.
Em 1885, CARLOS GOMES encontra-se triste e frustrado pela não-montagem de suas óperas novas, por estar compondo apenas canções para canto e piano, pelo adiamento das negociações com sua nova ópera O ESCRAVO, pelas gigantescas dificuldades com as despesas de Vila Brasilia e por saldar suas obrigações com Adelina.

Em carta de 19 de outubro de 1890 a Taunay, confessa:
“OH! OS ARTISTAS! ELES MATAM OU DÃO VIDA AO PAPEL QUE RABISCO." (Antonio CARLOS GOMES)
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Fonte: Meu livro "OLHOS DE ÁGUIA - ANTONIO CARLOS GOMES - A TRAJETÓRIA DE UM GÊNIO" - a ser publicado em 2011.
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Um comentário:

  1. Uma excelente postagem!
    Um Mestre das Letras falando sobre um Mestre da
    Música!
    Mestres que se foram e deixaram profundas marcas na cultura nacional.
    Rogoldoni

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